Afetividade

A requalificação da afetividade

Paulo Gaudencio

Já falamos que o homem equilibrado é um móbile frágil. Tem o que Kundera chamou de "a insustentável leveza do ser", isto é, se ele balança a qualquer sopro, tem um equilíbrio ao qual retorna. Isto se dá porque as emoções se equilibram entre si. O primeiro exemplo do equilíbrio entre as duas emoções é o que se dá entre a agressividade e a afetividade. Aliás, estou convencido de que a afetividade é o cimento das instituições no Brasil. Ela se manifesta como amizade, companheirismo. Corre o risco de cair no extremo do corporativismo e sua manifestação se torna contraproducente. Mas é no equilíbrio com a agressividade que vemos o afeto no papel profissional ter a possibilidade de se manifestar como componente de um dos maiores (e mais desperdiçados) instrumentos gerenciais. A soma da agressividade com a afetividade é a base do feedback. Está é a minha definição de amigo. Se estou errado, amigo fala para mim. Inimigo fala de mim. O resto é resto. Pior é inimigo, porque não fala. Hoje cedo fiz a barba. Fui para a frente do espelho. Como não me enxergo, se eu quiser me arrumar por fora, preciso de um espelho. Por dentro é pior ainda. Aí é que eu não enxergo. Se quiser me consertar, preciso de um espelho, de um amigo, que mostre para mim onde meu comportamento é inadequado. Quando estou fazendo um trabalho com casais, a tentativa é a de transformá-los em amigos. Evitar a "poeira embaixo do tapete" que é o grande fator destrutivo dos relacionamentos afetivos. Conseguir que o casal fale para o outro, como depoimento, não como acusação. O nome disso é diálogo, que na empresa responde pela alcunha de feedback. Um importantíssimo (e desperdiçado) instrumento gerencial. Porque as pessoas não falam que é manifestação de afeto. Não é perseguição. Outro dia tive uma experiência que tenho contado a muitas pessoas. Tenho uma propriedade rural perto de São Paulo (Guararema). Da porta do sítio até a porta da minha casa levo 1h15, porque vou pela Ayrton Senna, uma das melhores estradas do País. É certamente a mais policiada, velocidade máxima de 120 km/h. Se você puser o carro a 125 km/h certamente o guarda vai te parar, mandei consertar o carro e estava indo para o sítio, quando percebi que tinham desligado o velocímetro. O carro parou de me dar feedback. A estrada continuou 120 km/h. Que fiz eu? Esperei passar um carro, grudei na sua traseira, rezando para que ele seguisse a lei. Procurei um feedback. E aprendi que não é possível nem mesmo uma manhã de lazer no sítio sem feedback. Imaginem um casamento ou uma carreira. E as pessoas tentam, mesmo assim. Porque não sabem o que é manifestação de afeto no papel de profissional. Se eu estou errado, amigo fala para mim.